Escola contra o bullying
04 de maio de 2014 | 2h 02
Jairo Bouer – O Estado de S.Paulo
No domingo em que a maior parada de orgulho LGBT do Brasil (e uma das maiores do mundo) toma conta das ruas de São Paulo, é um bom momento para se repensar a questão da educação infantil no que diz respeito ao bullying, principalmente em relação à questão da orientação sexual.
Na última semana o jornal espanhol El PaÃs trouxe uma interessante matéria sobre um programa educacional de prevenção e combate ao bullying e ao assédio escolar (KIVa), desenvolvido em 2007, por pesquisadores da Universidade de Turku, na Finlândia. Hoje ele está implementado em 90% das escolas do paÃs nórdico e vem conquistando uma série de outras nações europeias.
O método é composto por cerca de 20 aulas, aplicadas em três momentos da vida dos estudantes – aos 7, 10 e 13 anos -, nas quais eles avaliam situações em imagens com os seus professores e classificam o que consideram simples conflitos ou casos de assédio. A partir daÃ, partem para exercÃcios que melhoram a construção da convivência em grupo.
Em cada uma das escolas participantes há um grupo de professores responsáveis pelo programa, mas toda equipe escolar está atenta à s situações que podem gerar conflitos e problemas. Os professores conversam com os assediadores, com as vÃtimas e com grupos de alunos, avaliam quando é necessário convocar os pais, e recebem suporte dos pesquisadores da universidade. A redução do número de casos é impactante.
O projeto foi uma reação aos episódios dramáticos (em 2007 e 2008), em que ex-alunos invadiram escolas e atiraram em outros estudantes por supostas situações de assédio vividas no passado. A Finlândia também apresentava, desde a década de 1990, uma das maiores taxas de suicÃdio do mundo, e o bullying era um dos principais fatores desencadeantes.
Um outro estudo importante, publicado no último dia 23, na versão online da revista médica americana Adolescent Health, avaliou o peso que o assédio contra minorias sexuais pode ter na saúde e no desempenho acadêmico desses jovens de ensino médio. Foram avaliados comportamentos como brigas fÃsicas, ameaças e ferimentos por armas, bullying nas dependências da escola, porte de armas e falta nas aulas por questões de segurança. Os pesquisadores utilizaram dados da pesquisa nacional Youth Risk Behavior, dos anos de 2009 e 2011.
Os resultados mostram que garotos com orientação homossexual foram mais expostos do que os heterossexuais a ameaça e ferimento por armas, bullying e falta na escola por questões de segurança. As garotas homossexuais foram mais expostas do que as heterossexuais a todos os padrões de comportamento avaliados. A conclusão do trabalho revela que, nos EUA, jovens que fazem parte de minorias sexuais continuam a ser vÃtimas mais frequentes de diversas formas de violência fÃsica e emocional, o que reforça a importância de interromper esse assédio no ambiente escolar, de uma forma mais estruturada, talvez como acontece hoje na Finlândia.
No Brasil, com o número crescente de crimes e violência contra minorias sexuais, fica evidente que o combate à homofobia tem de ser feito desde cedo. Além de um amparo legal mais definido, o trabalho ativo nas escolas, com um esforço concentrado dos pais na tentativa de desconstruir estereótipos e preconceitos, parece ser a melhor estratégia para que isso aconteça.
Por falar em oportunidade de trabalhar bullying e a desconstrução de preconceitos, vale a pena levar seu filho ou sua classe ao cinema para assistir ao filme nacional Hoje Eu Quero Voltar Sozinho. Uma lição de sensibilidade!
*Jairo Bouer é psiquiatra.