Excelente artigo para entender por que as crianças e jovens autistas e no espectro autista são vítimas fáceis de bullying. A autora, Tatiana Takeda, fala com propriedade sobre o assunto pois é mãe de uma criança autista e especializada no assunto. Você pode ler aqui no site um outro artigo sobre o assunto em http://www.bullyingnaoebrincadeira.com.br/#!home/c1hzh/Tag/autismo
"Bully é um termo da língua inglesa que significa “valentão”. A palavra bullying passou a ser empregada em referência a atos intencionais, repetitivos e agressivos, sejam verbais ou físicos, emanados de um ou mais indivíduos que, sem motivação aparente, causam angústia e aflição à vítima. Em regra, o bullying é cometido com a finalidade de intimidar ou mesmo agredir outra pessoa que, geralmente, não possui possibilidade ou capacidade de defesa, ou seja, é uma relação desigual de forças ou poder.
A vítima de bullying, comumente, tem medo do agressor em razão das ameaças e da violência física ou sexual. Trata-se de uma problemática existente em todo o globo e sua incidência tende a ser mais acentuada em escolas, universidades, locais de trabalho e vizinhanças.
As pessoas com deficiência tendem a serem as vítimas perfeitas do bullying. Em situação de vulnerabilidade, elas não intimidam o agressor cuja característica primordial é a covardia.De acordo com a “Sociedade Autista Nacional do Reino Unido (The National Autistic Society UK), mais de 40% das crianças e jovens autistas sofrem bullying, principalmente nas escolas. Isso tem um impacto devastador para o autista e sua família. As consequências para as crianças autistas são, entre outros, baixa autoestima, baixa produtividade escolar e extrema ansiedade. Alguns acabam por sair da escola definitivamente. Duas entre cinco crianças com autismo sofrem bullying na escola. Com crianças Asperger ou com AAF (Autismo de Alto Funcionamento), estudos apontam três em cada cinco. Na verdade, 90% dos pais de crianças Asperger afirmam que seus filhos já foram vítimas de bullying em algum momento. Meninos são mais atacados do que meninas, com uma margem de, respectivamente, 42% para os meninos e 36% para as meninas” (Fátima de Kwant/AUTIMATES).
Os autistas são vítimas em potencial dada sua inocência acrescida das dificuldades em estabelecer contato visual, entender figuras de linguagem, se comunicar e em relação à própria socialização que é, em regra, prejudicada. Alarmantemente, em parte dos casos, o autista nem entende que está sendo vítima de bullying. Principalmente quando o agressor se faz de simpático e aproveita da ingenuidade autista.
É importante que os pais conversem muito com seus filhos e fiquem atentos a sinais de alteração no comportamento ou mesmo escoriações, por menor que sejam. Caso desconfie que seu filho esteja sendo vítima, faça perguntas diretas à criança/adolescente ou mesmo ao adulto. O autista, em regra, possui como forte característica a sinceridade. Confuso, ele pode omitir, mas não vai mentir.
Também é construtivo que os pais consultem as escolas e informe-se sobre o protocolo de ação antibullying daquele estabelecimento de ensino. Demais disso, ensine seu filho a reagir. Ele precisa se afastar ou evitar estar perto de um agressor e relatar os acontecimentos a outra pessoa.
O agressor, também denominado “bullie”, é um ser de personalidade autoritária, controlador e dominador. São pessoas preconceituosas e de pouca habilidade social que possuem prazer/necessidade de humilhar o outro. Acredito que, na maioria das vezes, o bullie traz consigo a violência e o preconceito de casa, pois dificilmente vejo crianças/adolescentes bem criados pelos pais/responsáveis praticar bullying ou outro tipo de barbaridade.
Trago trechos de depoimentos de familiares de autistas vítimas de bullying citados pela jornalista Fátima de Kwant no site Autimates (2015):
“Meu filho sofreu tanto bullying que ele chegou a pensar em se matar. Começou a se cortar. Agora faz terapia para aprender a trabalhar isso. A gente acha que ele nunca vai se recuperar desses sentimentos...”
“Minha filha passou de uma menina confiante, feliz e despreocupada a um comportamento paranoico, depressivo e suicida. Ela até pensou em mudar de sexo, porque achava que sendo menino poderia sobreviver melhor ao bullying...”
“A escola negava o bullying. Ele só falava em morrer. Meu filho tinha sete anos e falava em morrer... A ansiedade dele era tanta, que se tornou hipersensível e nem podia usar alguns tipos de roupa. Bullying era, com certeza, responsável pela ansiedade...”
“Nós tivemos que tirá-lo da escola. Eles (escola) diziam que aquilo era ‘brincadeira de coleguinhas’...”
“Primeiro ele aguentou os tapas, depois começou a revidar. Quando não aguentou mais e machucou um dos bullies, foi expulso da escola!...
Esses tristes relatos nos fazem crer que as medidas antibullying devem ser “escandalosamente” divulgadas! Deve ser de conhecimento de todos que essa prática inescrupulosa e repugnante é proibida e, como tal, combatida com firmeza. Acredito que não é demais a escola mencionar isso nos manuais/cartilhas entregues aos alunos ou em reuniões com os pais. Com certeza, isso traria mais segurança aos genitores, tendo em vista que não é somente a criança/adolescente com deficiência que é vítima, mas também qualquer outra que possua qualquer característica que não se amolde às convenções feitas pelos próprios alunos truculentos.Há algum tempo, uma amiga entrou em contato me dizendo que na escola de suas filhas houve atividades didáticas no Dia da Conscientização Mundial sobre Autismo (2 de abril). Ela noticiou sua satisfação em ver que a escola promove esse tipo de inclusão e se preocupa em conscientizar as crianças que denominamos “neurotípicas” acerca da importância de respeitar todas as pessoas, independente delas terem características diferentes das convencionadas. Achei aquilo muito bacana. Infelizmente, não fiquei sabendo de mais nenhuma escola que tenha tido esta iniciativa louvável.Esse tipo de evento é uma forte arma contra o bullying. Por que não promover eventos que exaltem os talentos das pessoas com deficiência, ao invés de destacar suas limitações? Isso beneficiaria não somente os autistas, mas todas as demais à medida que passam a obter conhecimento acerca do autismo.
Tenha uma conversa saudável com os diretores e coordenadores da escola do seu filho. Mostre o quanto atitudes simples podem ser educativas e salutares para os estudantes, a ponto de contribuir para a formação do caráter do aluno, bem como para a confecção de medida antibullying.
Não espere acontecer algo bom ou ruim. Seja previdente. Com simpatia e informação legítima, mostre a todos o quanto nossos anjos azuis são especiais e merecem respeito. "
*Tatiana Takeda é mãe de uma criança com autismo, advogada, professora universitária, servidora pública, mestre e especialista em Direito e especializanda em Autismo.